sexta-feira, 10 de agosto de 2012

A Hora da Estrela

       Macabéa ao cair ainda teve tempo de ver, antes que o carro fugisse, que já começavam a ser cumpridas as predições de Madame Carlota, pois o carro era de alto luxo. Sua queda não era nada, pensou ela, apenas um empurrão. Batera com a cabeça na quina da calçada e ficara caída, a cara mansamente voltada para sarjeta. E da cabeça um fio de sangue inesperadamente vermelho e rico. O que queria dizer que apesar de tudo ela pertencia a uma resistente raça anã teimosa que um dia talvez vai reinvindicar direito ao grito.
       Ficou inerme no canto da rua, talvez descansando das emoções, e viu entre as pedras do esgoto o ralo capim de um verde da mais tenra esperança humana. Hoje, pensou ela, hoje é o primeiro dia de minha vida: nasci.

Clarice Lispector

2 comentários:

  1. Apesar de conhecer poucos textos de Clarice Lispector, considero-a uma das melhores escritoras do Brasil, por causa de momentos de beleza como este que tu postaste. Só senti falta de um comentário teu sobre o texto, mas vou aguardá-lo.

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  2. Neste tópico Literatura In Extremis estou tentando fazer uma seleção de pequenos fragmentos de qualquer gênero literário que trate sobre esse momento intenso e angustiante dos últimos segundos antes da morte. O blog foi criado em função desse tema a partir do poema In Extremis de Olavo Bilac. Sempre me impressionei com o tema da morte e muito mais com as tentativas de descrições do momento quando se está diante da morte ou prester a morrer. Nesses momentos a vida parece ganhar muitos significados que nunca existiram, a vida parece que se torna vida apenas em função da morte.
    Assim, aqueles que souberam de textos que envolvem essa temática podem indicar para ir complementando essa selação que eu resolvi iniciar.
    Fico grata pelo comentário.

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