segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O QUE É LITERATURA? MARISA LAJOLO


Definir o que é, o que não é e o que pode ser literatura, depende do ponto de vista, do sentido que a palavra tem para cada um, da situação na qual se discute o que é literatura.
A obra literária é um objeto social. Para que ela exista, é preciso que alguém a escreva e que outro alguém a leia. Ela só exista enquanto obra neste intercâmbio social. Porém, em nossa sociedade moderna, antes que se cumpra tal natureza social, através da interação estética entre dois sujeitos (autor e leitor), a obra passa por uma espécie de corredor comercial e pelo aval dos canais competentes. No primeiro caso a obra passa a ser apenas mais um produto da sociedade de capital. No segundo depende do endosso de setores especializados para ter reconhecida sua literariedade, como o fez e faz as escolas, definindo, ex. vi., obras clássicas.
A definição de literatura perpassa por múltiplas respostas. Não existe uma resposta correta, porque cada tempo, cada grupo social tem sua resposta, sua definição para literatura. Mas parece haver uma profunda relação entre as obras escritas num período e aquilo que, nestas obras, costuma ser identificado como o específico literário. Desenvolve-se, assim, uma espécie de diálogo ininterrupto entre a prática e a teoria da Literatura. Para se entender um pouco de literatura cabe então apontar como a literatura foi diferentemente concebida em diferentes momentos da história.
A idéia de literatura esteve (e ainda está mesmo que de maneira menos latente) sempre associada à escrita. Apenas o que está escrito poderia ter algo de literário. Tal noção está fortemente associada à elitização do domínio da escrita. As produções não-escritas possuem, geralmente, caráter popular e, portanto, sempre estiveram à margem da literatura. Toda e qualquer palavra, toda e qualquer construção lingüística pode figurar no texto e literalizá-lo. A linguagem parece torna-se literária quando seu uso instaura um universo, um espaço de interação de subjetividades (autor e leitor) que escapa ao imediatismo, à predictibilidade e ao estereótipo das situações e usos da linguagem que configuram a vida cotidiana. O mundo da literatura, como da linguagem, é o mundo do possível, através da recuperação do passado no presente.
Embeber-se e fazer embeber em sentimentos, transmitir emoções, amarrar-se em verdades científicas do tempo, fazer o sentido emergir de contornos claros e realçados por torrentes de luz que destacam massas e volumes são concepções de literatura desenvolvidas ao longo dos tempos que possuem intensas semelhanças. Todas buscam um significado para a literatura. Hodiernamente, mais do que um significado determinado, o que é próprio da literatura é encenar a própria linguagem.
Pode-se pensar atualmente que a literatura como linguagem está sozinha, sem prestar contas às teorias que a viam como forma de interpretações da realidade com uma prática literária inquietante. Renuncia, então, a literatura posterior ao entre - séculos a qualquer anseio de totalidade premeditada. Mergulha na significação provisória e tem nesse provisória a arma da sua permanência.

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