segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

ROBERTO ACÍZELO DE SOUZA: TEORIA DA LITERATURA

A teoria da literatura é construída através da problematização do literário, revelando obscuridades cujo esclarecimento justifica o empenho da razão analítica e metódica. A literatura poderá ser teorizada na medida em que a problematizamos.
Tal ocorre pela primeira vez com a civilização ocidental, iniciando através dos estudos de Platão e Aristóteles. Antes deles a produção literária em si mesma tratava de questões da sua função, natureza e origem, como ocorre, por exemplo, com a Odisséia e Ilíada, porém, aqui, não há consciência ou preocupação teórica. Somente a partir das produções dos mestres gregos inicia-se uma elaboração teórica sobre literatura que tenderá a posições normativistas ou descritivistas, sendo ambas integrantes de uma corrente que considera a literatura como um estudo. Haverá outra corrente, desenvolvida nos fins do séc.XIX e início do séc. XX, que entenderá a literatura apenas como fruição, desenvolvendo-se o impressionismo crítico.
A literatura é estudada por várias disciplinas, cada qual com enfoque diferenciado: poética, história da literatura, crítica literária, ciência da literatura e teoria da literatura. Esta última possui um sentido lato (englobando o estudo da literatura como um todo) e um sentido stricto (nesse caso a teoria da literatura seria um ramo de estudo metódico, aberto à pluralidade de produções literárias e de seus modelos de análise). A teoria literária, como novo método de estudo, foi empregada pele primeira vez por Wellek e Warren no séc. XX, sendo uma disciplina com enfoque diferenciado em relação à estética, retórica, poética, história da literatura, crítica literária e impressionismo crítico, disciplinas anteriores ao séc XX. A teoria da literária atual é a nova faceta da poética, voltada para o estudo da literatura de cunho descritivo-especulativo e marcado pela preocupação de discutir seus métodos e conceitos.
Na passagem do séc. XIX para séc. XX vários fatores contribuirão para o surgimento de correntes com metodologia diferenciada, mas que por se tangenciarem formarão o arcabouço teórico da nova disciplina Teoria da Literatura. A crise do historicismo e positivismo somado ao desenvolvimento da fenomenologia, sistematização da Lingüística, surgimento das vanguardas e da escola psicológica gestaltismo contribuíram para o surgimento de novas correntes de estudo da literatura: estilística, formalismo russo, escola morfológica alemã nova, crítica anglo-americana, fenomenologia dos estratos.
Tais correntes irão possuir em comum a investigação do próprio texto, entendido como um arranjo especial de linguagem cujas articulações e organização podem ser descritas e explicadas na sua imanência. Distanciam-se dos modelos biográfico-psicológicos e sociológicos (da história da literatura, crítica literária e ciência da literatura) e filológicos, pela preocupação em delimitar seu objeto (não o considerando numa concepção tão ampla) através da aplicação de um método rigoroso próprio do objeto literário, não se apropriando do método de outras ciências (história, sociologia, filologia) distanciando-se de uma preocupação externa da obra.
A teoria da literatura teve seu apogeu nas décadas de sessenta e sessenta, passando a declinar a partir da década de noventa, devido à relativização da literatura e institucionalização de uma disciplina denominada “estudos culturais”, tal declínio é alvo de debates recentes. Muitos ainda questionam seu vigor acadêmico e a necessidade de tal metodologia de estudo literário (caráter auto-reflexivo, conceitualismo, compreensão da natureza histórica tanto do seu objeto, quanto das hipóteses que formula para explicá-los).
O principal desafio da teoria da literária é a definição de seu objeto (para as tendências diante do século XX, qualquer texto escrito era literatura), devido à pluralidade de idéias que se tem a respeito de literatura e poesia. Dentre os vários significados de literatura, pode-se considerar o conceito de literatura stricto sensu, como o limite para o objeto da teoria literária. Em relação à poesia, pode-se entendê-la, enquanto objeto da teoria literária, quando qualquer linguagem metrificada ou não possui propriedades artísticas e/ou ficcionais por oposição às demais outras escritas.
Ou seja, o método empregado pela teoria literária, torna-se mais sofisticado, pois busca a literariedade dos textos em oposição a textos que não a possuem. Assim a literatura stricto sensu enquanto objeto da teoria literária, pode ser entendida como um conjunto da produção escrita e, eventualmente, certas modalidades de composições verbais de natureza oral (não-escrita), dotadas de propriedades especificas (espécie de “desvio” que a diferencia de outros textos), que basicamente se resumem numa elaboração especial da linguagem e na constituição de universos ficcionais ou imaginários. Desta monta o método adotado só poderá ser o da busca à literariedade.
Entendida as questões primárias, ou seja, de base para a compreensão da teoria literária (definição de objeto e método) passa-se a outros problemas que integram o universo conceitual da teoria da literatura.
A teoria surgida no inicio do século XX enquanto metodologia diferenciada do estudo da literatura, como dito alhures, possuía várias correntes, com orientações diversificadas. Todas as correntes visavam estudar o objeto literário através de um método próprio para tal estudo, ou seja, buscavam estudar a obra em si mesma. As orientações e conceituações desse estudo irão, porém, ser diferentes dependendo da corrente em questão. As correntes denominadas textualistas buscavam privilegiar o texto, propondo-se, portanto à consideração imanente da literatura, como o são a estilística, formalismo eslavo, escola morfológica alemã, new criticism, estruturalismo e poética gerativa. Já as fenomenológicas baseiam-se na filosofia de Martin Heidegger, sendo elas: a teoria fenomenológica dos estratos, a escola de Zurique e a critica ontológico-hermêneutica. Por fim há as correntes sociológicas, com preocupações sociológicas ou ético-políticas, são elas: a critica existencialista, marxista, sociológica e a estética da recepção.
A teoria literária por volta dos anos 60 irá retomar algumas disciplinas em seu estudo que foram desprezadas pela maioria das correntes do inicio do século XX. Assim com o fenômeno da interdisciplinaridade há o retorno dos campos da antropologia, psicanálise, semiologia ou semiótica, teoria da comunicação, história, sociologia, filosofia e psicologia além da filologia, ecdótica, na teoria literária. Todos esses ramos estão interligados pela lingüística - ao desenvolvimento da idéia de que todos os níveis do conhecimento possuem um elo através da linguagem.
A teoria da literatura tem por núcleos básicos da investigação a questão do método, objeto e estatuto das disciplinas, suas afinidades com outras disciplinas, seu histórico de investigação relativo à literatura, busca de um conceito de literatura, de relações entre a linguagem literária e os sistemas extratextuais ou com outras produções culturais, estudo dos gêneros literários, dentre outros. Tal estudo não se revela improfícuo, pois através dele a literatura deixa de ser apenas uma fantasia encantadora e comovente, para se apresentar como produção cultural tão plantada na realidade, na vida, quanto empenhada em revelar-lhes os aspectos mais esquivos à nossa compreensão.

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