Cantar no momento da morte significa consolo. O canto fúnebre traz consigo a tristeza num desejo de voltar a ser feliz. Ser feliz novamente significa esquecer a Morte, quando sua presença está real demais. A ilusão da eternidade é o que nos interessa? É na Música da Morte de Cruz e Sousa que somos capazes de sentir e até de viver essa resposta num lapso poético.
Tememos a morte, pois ela é nebulosa, estranha e sombria. Mas esse temor parece estar sempre carregado de um fascínio. O desconhecido não apenas nos aterroriza, mas nos impressiona. A vida apenas acontece quando temos coragem de ir para o lugar do desconhecido. Mesmo com minha’lma fria e gélida, ou seja, mesmo paralisados e duros de medo há algo de encantador nesse estranho que nos faz tremer.
Ao tremer o corpo se aquece e quer evitar a morte por congelamento. Ganhamos ânimo. A maravilha do desconhecido supera o medo da morte para avançarmos rumo à morte. Cruz e Sousa traz as sinestesias do endurecimento e do calor que reanima. A Música da Morte nos envolve durante a vida numa relação perturbadora de medo/paralisia e ânsia, agitação e fascínio.
As ondas são perturbações oscilantes e é através delas que o som se propaga. Nas ondas da morte Cruz e Sousa fala de uma oscilação nervosa, exagerada, que consiste em nosso caminhar nervoso e amedrontado; numa convulsão de choro e dor.
O desconhecido da Morte nos leva ao medo do esquecimento, do deixar de existir, do não-ser. Mas o medo de nada adianta, pois vivemos uma tragédia tão certa e perfeita quanto a consonância de uma sinfonia. Esse destino certo nos aterroriza, mas é no gozo desse medo, dessa dor que podemos viver. Afinal sem a morte não temos vida. Se não há dor nem sofrimento, não há felicidade nem regozijo.
É por isso que em Cruz e Sousa a Música da Morte cresce e recresce, invadindo, tumultuando e apavorando mas também alucinando, no prazer que a alucinação é capaz de dar ao homem. No gozo que destrói. O ópio que dá o prazer e mata. A droga que nos leva a uma paz, à calmaria que nos cega lentamente, numa vertigem, nos levando a um sono profundo de morte que fascina e nos faz cantar, como Raul Seixas: “Vem (morte), mas demore a chegar. Eu te detesto e amo, morte, morte, morte, Que talvez seja o segredo desta vida”.
Para a professora Venúzia,
Thais Carvalho Fonseca
Gostei do diálogo poético entre Raul Seixas e Cruz e Sousa.
ResponderExcluirConduzir o leitor para a experiência sinestésica que o autor experimentou em determinada circunstância narrada acho que é o melhor caminho para o que as palavras não dão conta no processo narrativo. Eu tento fazer isso ao escrever comentários musicais, por exemplo.
ResponderExcluirAdorei o texto.
abraço
Também penso na música como a manifestação artística com o maior poder de sair da condição de representação da arte e nos fazer sentir, viver, ser...
ResponderExcluirabraços